O ofício do
Ministério Público Federal que deu origem à Operação Métis, que apura ações da
Polícia Legislativa do Senado para obstruir investigações da Lava Jato, informa
que os servidores presos nesta sexta-feira tinham “plena consciência da
ilicitude de seus atos”. O texto anota que os presos “foram devidamente
avisados pelo Setor Jurídico do Senado Federal.” Algo que, na opinião da
Procuradoria da República, “reforça a gravidade de suas condutas”, (a íntegra
está disponível aqui).
O documento
foi enviado na véspera da deflagração da operação para a 10ª Vara Federal de
Brasília, de onde partiram os mandados de prisão e de busca e apreensão.
Signatário da peça, o procurador da República Frederico Paiva sustenta, em
termos categóricos, que foram recolhidos “indícios suficientes da prática de
crimes de obstrução de justiça com o escopo de obstaculizar a atuação da
Polícia Federal no âmbito da Operação Lava Jato”.
A
manifestação do procurador contraria frontalmente o teor de nota divulgada
nesta sexta-feira por Renan Calheiros (leia aqui). Nela, o presidente do Senado escreveu:
“Convém reiterar que Polícia Legislativa exerce suas atividades dentro do que
preceitua a Constituição, as normas legais e o regulamento administrativo do
Senado Federal.” O senador não fez menção a nenhum alerta do setor Jurídico.
Limitou-se a informar que, deflagrada a operação, “o Senado designou advogados
do próprio órgão para acompanhar todos os procedimentos até a conclusão das
investigações”.
Em seu
ofício, o procurador Frederico Paiva deixa claro que as ações dos servidores da
Polícia do Senado não foram aleatórias. Eles sabiam o que buscam quando
visitaram residências e escritórios do ex-senador José Sarney (PMDB-MA) e dos
senadores Lobão Filho (PMDB-MA), Fernando Collor (PTC-AL) e Gleisi Hoffmann
(PT-PR). “A partir das informações cuidadosamente colhidas pelo Departamento de
Polícia Federal, vê-se que a estratégia utilizada pelo grupo consistia na
utilização de estratagemas para possibilitar a descoberta de captação ambiental
implementada com autorização judicial”.
Considerando-se
a gravidade das prisões e teor do documento do procurador, fica-se com a
impressão de que os congressistas estavam sob monitoramento ambiental, não
escutas telefônicas. Novamente, o texto da Procuradoria desdiz a nota de Renan
Calheiros. O senador tratou as ações de sua polícia com doce naturalidade.
“Atividades como varredura de escutas ambientais restringem-se a detecção de
grampos ilegais (Regulamento administrative do Senado Federal, Parte II,
Parágrafo 3, inciso IV), sendo impossível, por falta de previsão legal e
impossibilidades técnicas, diagnosticar quaisquer outros tipos de
monitoramentos que, como se sabe, são feitos nas operadoras telefônicas”.
Quer dizer:
Renan se refere a escutas ambientais como se todas fossem ilegais, o que não é
verdadeiro. E alega que seus agentes não poderiam cometer ilegalidades já que
os grampus telefônicos convencionais são feitos nas instalações das operadoras
de telefonia, não nos imóveis de eventuais grampeados.
O procurador
Frederico Paiva foi premonitório. Antes de saber o que Renan alegaria, já
providenciou o antidote: “Importante ressaltar que a realização de varreduras,
por si, não constitui crime. Ocorre que, por se tratarem de endereços
vinculados às pessoas objeto de investigação no âmbito do Supremo Tribunal
Federal, sobre as quais há uma atuação do Estado coordenada e vinculada no
intuito de esclarecer fatos supostamente criminosos, a deliberada utilização de
um equipamento sofisticado, de propriedade do Senado Federal, utilizando
recursos públicos, passagens aéreas custeadas pelo Erário e servidores
concursados, em escritórios ou residências particulares, não possui outro
objetivo senão o de embaraçar a investigação de infração penal que envolve
organização criminosa”.
Segundo o
procurador, “as varreduras foram determinadas por Pedro Ricardo Araújo Carvalho
[diretor-geral da Polícia do Senado, homem da confiança de Renan], após notícias
divulgadas no sentido de que senadores da República e o ex- senador José Sarney
eram alvo de investigação no âmbito do Supremo Tribunal Federal.” Acrescentou
que Pedro Ricardo contou com a “com o apoio imprescindível de Antônio Tavares
dos Santos Neto, Everton Elias Ferreira Taborda e Geraldo César de Deus
Oliveira para executar os atos de obstrução de Justiça”. Todos eles foram
presos e tiveram suas casas varejadas pela Polícia Federal.
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